quinta-feira, março 25, 2004

CLIC

Não são raras as vezes que as pessoas utilizam este termo, não para reproduzir verbalmente um estalido de determinado objecto (como quando se liga um interruptor), mas antes referindo-se ao fenómeno que se desenvolve, sob a forma de combustão espontânea, quando se sentem particularmente atraídas por alguém. Este clic vale o que vale, embora assuma valorizações diferentes em função dos contextos e da personalidade de cada um.
Dizia-me um amigo que “quando não há o clic, apesar de haver atracção, mais vale não investir, porque acaba por não resultar em nada”. Na verdade, são muitos os que sustêm a ideia de que, sem esse clic, o desenvolvimento de algo mais profundo está rotunda e automaticamente condenado ao fracasso, como se fosse uma condição sine qua non
A minha visão diverge, em grande escala, desta crença, uma vez que pode redundar num minimalismo que, per se, constitui um inibidor, à priori, da transposição da superficialidade. Na história dos relacionamentos, as relações pré-concebidas de causa-efeito são altamente falíveis, o que sugere que esta crença parece não ter validade nem utilidade.
Reconhecendo que o clic funciona como uma predisposição inicial para o avanço, acredito, não obstante, que este não tem de ser, obrigatoriamente, espontâneo e imediato, sendo passível de uma depuração gradual resultante de combinações multifactoriadas. Além disso, nem sempre este fenómeno consegue operar-se na esfera do consciente, pelo que o clic pode ter ocorrido num precedente não considerado e apenas se vir a deduzir a sua manifestação muito mais tarde.
Nessa linha de pensamento, fará sentido pautar os nossos investimentos pela ausência/presença de clics imediatos? Estar-se-á, eventualmente, a coartar a hipótese de vislumbrar esse clic à posteriori… E tenho reparado que, ao reger-se por esta ideologia, a pessoa torna-se cada vez mais exigente na busca desse clic, reduzindo ainda mais a possibilidade de o encontrar.
A naturalidade e espontaneidade das coisas não deve ser congeminada, pois que se aniquilam de imediato. E torna, assim, a vivência emocional muito mais limitada…

Duende